freestyle #1

  • segunda-feira, 8 de dezembro de 2008
  • Wash.
  • um pouco de jazz e gim no fim da uma noite fria
    um pouco do calor dela
    que sobe da sua pele macia

    geralmente eu sei o que quero, só não sei como conseguir
    talvez noites frias em Juneau
    talvez tardes quentes em Barcelona
    geralmente eu consigo, só não sei o que quero

    é uma questão de tempo, eu sei.
    respiro cada lufada de ar, dou um passo maior do que a perna, boto a carroça na frente dos cavalos
    alcanço de um meridiano à outro com um abraço, com folga nas mãos
    questão de tempo

    agora
    no momento
    só me basta um pouco do gim e do jazz
    e dela, a pele macia
    pra aquecer essa noite fria

    ***

    minha idéia sobre poesia é a seguinte: em demasiado, poesia é um saco. o lance é que eu prefiro a parte analítica e descritiva da linguagem, e às vezes - ou quase sempre - me parece que poesia dá muitas voltas e não chega a lugar nenhum. mesmo porque parece que essa é a função da poesia: enfeitar o que era direto.

    mas é bonito. Manuel Bandeira por exemplo, é bonito. encaixe perfeito de palavras. trabalhar o anagrama de cada palavra pra que se tornasse criptografado os sentidos místicos de cada frase. às vezes ele demorava até 15 anos numa única poesia. eu NUNCA seria Manuel Bandeira, mesmo que não fosse amador. estou mais pras poesias "freestyles" do Bukowski, aquele jeito "chinaskiano" de botar as palavras. acho que por isso mesmo que como poeta, ele deu um ótimo cronista...

    sobre sabado de sol

  • domingo, 26 de outubro de 2008
  • Wash.
  • (anotação pra si proprio): life is sweet... sabado ensolarado no parque Ibirapuera, junto da gatinha, amigos, cervejinha gelada... a lenda viva do jazz Sonny Rollins tocando de graça... pois é, a gente não tem dinheiro, vive na merda, mas as vezes a vida é boa: só precisa do que já tem.

    Jah bless you, ma children...

    sobre..... nada?

  • terça-feira, 7 de outubro de 2008
  • Wash.
  • hmm... faz tempo que eu não escrevo nessa porcaria. preguiça pura. aliás eu ainda tou pensando COMO eu vou escrever com esse monte de alterações IMBECIS na acentuação da lingua lusitana... de boa, isso é coisa de quem não tem o que fazer. aliás "é" ainda tem acento agudo?...

    enfim. enquanto isso vão curtindo essa lista de 10 video clipes que eu fiz. quando eu era moleque a MTV tinha um programa, esqueci o nome, mas o artista escolhia 10 clipes que ele mais gostava ou achava que valia a pena exibir. geralmente eu achava idiota as escolhas, e falando com a tv eu dava a minha opinião, qual eu tiraria ou colocaria no lugar. bom, agora tem meia duzia de pessoas que leem o que eu escrevo, então isso é um levantamento sério (sério ainda tem acento?...) portanto não riam e nem ignorem como futilidade e nem critiquem, porque são 10 bons clipes de 10 boas músicas (música ainda tem acento?...)

    (não vou colar os videos aqui senão vai virar um escarcéu pra abrir depois. vai só os links, se voce tiver interesse, vai nos links)

    * Cibo Matto - Sugar Water
    * U.N.K.L.E. - Rabbit in Your Headlight
    * Radiohead - Just
    * Jawbox - Savory
    * Replacements - Bastards of Young
    * Neneh Cherry - Woman
    * Fatboy Slim - Praise You
    * Pharcyde - Drop
    * Soulwax - e-Talking
    * King Missile - Detachable Penis

    sobre fantasmas e "obakês"

  • quinta-feira, 24 de julho de 2008
  • Wash.
  • o teto irregular do meu quarto me causa a impressão de estar num cenário daquele filme marco do cinema expressionista alemão, O Gabinete do Dr. Caligari. dá um certo receio; chego a imaginar se o sonâmbulo Cézare não estaria ali fora me espreitando, esperando pra que eu durma...

    ***

    às vezes imagino deitado também, sob a luz da tela do computador, que ali naquela quina da parede começa a brotar um tufo de cabelos negros e lisos, assim como daquela mulher absurdamente escrota daquele filme de "obakês" nipo-americano The Grudge, e já me corre um arrepio da espinha até a nuca. conto pras pessoas que eu me borro de medo pra esse filme e geralmente não entendem o porquê: "ahhh, tem filme pior, mais assustador que esse! é até bem bobinho, pra falar a verdade!"... é o que costumam comentar sobre ele. é verdade, tem filme que assusta mais; mas geralmente não me impressiono com filmes. mas esse em especial me impressiona. esses bagulhos bizarros e inexplicáveis do imáginario japonês me assustam de fato; primeiro porque eu sei que nem tudo é "imaginário" nessas estórias: elas tem um fundo de verdade, distorcido, mas tem. não sei se a culpa disso se deve ao ímpeto sádico da personalidade japonesa, ou talvez pela natureza confusa da visão espiritual da pós-vida no shintoísmo. enfim, é algo quase inalcançável pra nós, reles materialistas ocidentais, o politeísmo oriental, a reencarnação, o karma, essas coisas todas; e segundo, porque eu já morei numa porra de uma casa idêntica àquela do filme...

    "Obakê" é o termo em japonês usado pra fantasma, assombração. existem várias entidades do mal na cultura japonesa, e geralmente elas são cruéis. não que o imaginário católico também não seja, com suas crucificações, infernos com penúrias indescritíveis e tal; mas a crueldade japa envolve tortura com agulhas, cordas, espadas, castração... é uma crueldade MUITO cruel, se é que me entende!! e mulheres de branco com cabelo na cara... eca!, como odeio essa personalidade! e por incrivel que possa parecer - corro o risco de perder toda a credibilidade pelo que vou contar... mas eu já vi algo parecido com aquilo.

    acho que foi em 2000, deve ter sido. era um inverno brutal, coisa de 8, 10 graus abaixo de zero no meio da noite, e eu tava na casa de um casal de amigos que moravam em Suwa-chi, cidade vizinha a que eu morava na época, Chino. pra chegar de Suwa à Chino haviam dois meios: pegar a "kousôko" intermunicipal e pagar pedágio, ou subir pela encosta da montanha que dividia as duas cidadelas. a montanha era muito mais escura, dessinalizada e fria, mas quem se importa? meu carro tinha pneu pra neve, aquecimento e faróis!... e fui pela montanha mesmo. no pé da montanha a iluminação da estrada acaba e vc tem que se virar com os faróis do próprio carro, subindo as curvas sinuosas e super-fechadas até o topo. precisa de uma certa agilidade - e paciência - pra chegar até o topo. uns 20 minutos, baseando na altura da neve na estrada e na velocidade segura pra não derrapar e cair no precipício...

    enfim, chegando no topo da montanha havia um trecho reto, de um ou dois quilometros, até iniciar a decida do outro lado pra chegar na minha cidade. eis que no meio desse trecho reto, um local deserto em que a estradinha era rodeada de floresta de tundra e neve, somente isso - eu meti um farol alto pra ver a distância, já que era improvável o tráfego de veiculos naquele clima e naquela hora, além do meu, e não ia atrapalhar ninguém. me lembro claramente, como se fosse agora. quando subi o farol, passei por uma figura que não deveria estar ali, daquele jeito, naquela hora da noite. a visão foi rápida, primeiro pela minha velocidade e depois porque não quis parar pra ver direito ou tentar ENTENDER o que seria aquilo que eu vi: uma pessoa, parecida com uma mulher (não tenho certeza porque não vi seu rosto) vestida toda de branco parada na beira da estrada, com um cachorro também branco ao seu lado. ela estava lá, ereta e imóvel, em pleno meio do nada que faziam 10 graus negativos, com 30 centimetros de neve no chão, vestida só com um pano branco dos ombros ao chão. dois detalhes deixavam a figura ainda mais incompreensivel pros olhos: não vi seu rosto, talvez pela velocidade que passei, mas talvez porque era uma coisa TODA BRANCA no lugar de um rosto. e não consegui notar PÉS fixados no chão.

    passei por essa "coisa" sem nem pensar em parar pra saber o que uma mulher fazia ali, naquela hora, naquele frio, com aquelas roupas aparentemente finas. olhei pelo retrovisor pra ter certeza do que vi. a luz vermelha traseira indicava que a coisa não se moveu um milimetro sequer assim que passei por ela. nem o cão. continuaram lá, imóveis. NESSE MOMENTO que escrevo isso, minha credibilidade só não vai por água abaixo, porque a minha co-piloto no momento olhou pra mim e disse: "VOCE POR ACASO VIU AQUILO?"... a minha resposta foi direta: "vi. não olha pra trás e REZA pra esse carro não parar aqui agora."

    graças aos céus o carro não parou. cheguei em casa são e salvo, mas não consegui dormir direito aquele dia pela dúvida do que eu vi. posteriormente contei o episódio pra alguns amigos. perguntei se existia alguma estátua no local ou coisa parecida, mesmo sabendo que não era uma estátua que eu vi aquele dia. ninguem soube responder. a maioria não entendeu, outros acharam que era mentira minha. engraçado esse medo primitivo que a gente sente por coisas que a gente não entende. mas não deixa de ser MEDO. é primitivo, mas é forte.

    sobre uma noite na Vila Mimosa

  • terça-feira, 22 de julho de 2008
  • Wash.
  • pessoas passam por experiências na vida que, com certeza, deveriam ser registradas para a posteridade. ter um ataque do coração, por exemplo. ou pegar uma onda de 50 pés. trombar um urso marrom numa floresta e sair ileso pra contar a estória. ou quem sabe presenciar uma chuva de sapos... bem, eu tenho uma experiência de vida pra esse devido registro: um passeio noturno pela Vila Mimosa.

    em 2005 fui ao saudoso Rio de Janeiro pra dois showzinhos intimistas, que ficou algo entre amigos, basicamente. um dos shows miou e acabou rolando um só, e o dia seguinte foi pura diversão de turista-nerd-branquelo-que-nunca-sai-de-sãopaulo; tudo bem que não foi as mil maravilhas: tava um calor insano que eu nunca havia passado antes, de 41 graus marcados no termômetro da praia, e o Podrinho derrubou um coco verde em cima do meu dedinho do pé, esmagando o pobrezinho... mas fora isso foi bom!...

    anyway, na noite do show nos dirigimos ao local e passamos o som, assim bem urgente e homogêneo, e pronto, ficamos de bobeira do lado de fora, esperando o início dos shows da noite e observando o movimento de pessoas vestidas com camisetas pretas e calças grossas e sobretudo e coturnos em plenos 37 graus que a noite fazia... e tentando entender se aquilo fazia sentido. foi quando nosso ilustre impagável amigo Luis Menezes, nosso cicerone oficial das belezas e presepadas da Cidade Maravilhosa, teve uma idéia sensacional: "ei... quero levar vocês num lugar boladasso! é aqui do lado, 3 quadras daqui, sacoé??... vamo na Vila Mimosa", ele disse no seu carioquês fluente. "já ouviram falar?"; eu já tinha visto uma reportagem num programa que chamava "Documento Especial", uma espécie de Globo Repórter trash que passava na extinta rede Manchete, quais os temas recorrentes sempre envolviam putaria, brigas de traveco, voodoo, bizarrices, coisas escrotas e afins; coisas que jovens pré-internet como eu adorava ver na tv no começo dos anos 90. a matéria apresentava a Vila Mimosa, um vilarejo incrustado a caminho da zona norte do Rio, próximo à Praça da Bandeira, que abriga provavelmente a maior quantidade de prostitutas por metro quadrado no mundo. parece que o lugar existe a 80 anos e, por problemas relativos óbvios, já mudou de lugar duas vezes até encontrar seu destino atual ali, a 4 quadras de onde estavamos.

    "bora pra lá!", topei na hora com o Menezes. o pessoal todo também se empolgou e vamo que vamo, em direção ao sensacional shopping de putas. uma quadra antes de chegar, o Menezes parou e virou pra gente. "perae. é o seguinte: o lugar tem regras próprias e é melhor eu explicar pra vocês antes da gente passar daqueles portões (não sei porque mas na hora me veio a Divina Comédia na cabeça...) porque passou dali, nem a policia manda: eles só vem pra buscar o corpo estendido no chão...; procurem não embaçar em mulher que já estiver acompanhada. tentem não esbarrar nem pisar no pé de ninguém. procurem não deixar nenhuma delas nervosa, porque rola uns seguranças locais. e garotas: melhor vocês não entrarem, porque a probabilidade de confusão DOBRA" - e o coro das garotas foi de decepção - ...senhores: comtemplem a VILA MIMOSA!!!

    tenho que dizer que não foi a mesma impressão de curiosidade que me abateu quando vi o documentário. foi diferente. foi MUITO MAIS intenso. foi um misto de contemplação com um certo receio, um medo profundo contido com espanto pelo absurdo da situação. confesso sim que fiquei com medo pela inospitalidade do território. parecia que as pessoas farejavam com seus narizes que não eramos dali!!; mas isso foi por um momento breve de adaptação e de repente estavamos perambulando por entre as vielas avermelhadas pelas luzes dos puteiros, empencada de gente que cheirava a graxa e álcool, de suor forte e frontes oleosas. seguiamos o fluxo das pessoas, com aquele puta receio de que na próxima curva das vielas fosse um beco sem saida, ou uma emboscada sinistra. mas não, era só uma impressão estranha, pois todas as vielas se entrelaçavam. com o tempo fui sentindo até que o ar de cada puteirinho era convidativo, afinal essa era a intenção: convidar!

    aos pés de portas vermelhas ostentavam-se mulheres seminuas, vestidas por micro-shorts e tops, as vezes uma alegoria de carnaval, um tapa-sexo, as vezes sem a parte de cima; a cada sobradinho de cada viela uma surpresa qualquer, mesas de bilhar, mulheres corpulentas sentadas uma sobre as outras; passamos por uma grade que expunha 3 garotas com as pernas escancaradas para os transeuntes, e sobre elas pendia uma placa com os dizeres "$1 REAL A DEDADA"... só imagino quantas mãos mal-lavadas ao dia passavam por aquelas... não. melhor não imaginar. eu era nesse dia um típico turista gringo: vestia uma camisa havaiana florida, bermuda estilo US ARMY, chinelos de dedo e um boné de baseball. o Menezes olhou pra mim e disse "vamos curtir um pouco: finje que tu é gringo e começa a falar em inglês..." entrei na onda e comecei a balbuciar palavras em inglês, pra não ficar muito óbvio meu fingimento, e algumas mulheres já se interessavam de forma diferente perguntando pra ele se eu não queria dar uma provinha do material em troca de uns miseros niqueis, se quisesse nem precisava pagar!!: a cara era, lógico, arrumar um gringo endinheirado e sair daquele lugar, quem não queria???

    enfim, isso se passou em 20 minutos. óbviamente tudo ficou só nas risadas e na impressão de algo dantesco presenciado; não nos aprofundamos em nenhuma dona, claro. nossas namoradas nos esperavam do lado de fora do portão, um show nos aguardava em poucos minutos e, o mais importante e transparente, ninguém ali tava afim de voltar pra casa com uma facada no bucho ou, numa hipótese pior ainda, uma doença sexualmente transmissivel mortal no coro. de qualquer forma foi uma experiencia visual incrivel. mais tarde um gringo que nos acompanhava no dia também se aventurou a conhecer a famigerada vilinha, e a cara que ele voltou de lá foi impagável, aquela cara de "não acredito que aquilo que eu vi existe mesmo". o resto da noite não teria sido igual sem aquele passeio. obrigado Menezes.

    sobre a raiva pelo semelhante

  • segunda-feira, 30 de junho de 2008
  • Wash.



  • garoto enxaqueca, de Greg Fiering. tem coisa melhor pra mexer na net as 4h30 da manhã do que isso não. dá só uma olhada: http://www.flickr.com/photos/28728377@N07/sets/72157606240463794/

    sobre música, religião, e ouvir Morphine na rua.

  • domingo, 29 de junho de 2008
  • Wash.
  • eu acho que a música realmente influencia no jeito de ser da gente. pelo menos tenho certeza que influencia no MEU jeito de ser. acho que provoca a mesma sensação em alguém que é religioso na busca pela sua fé, já dizia São Coltrane, e se minha assinatura tivesse crédito na praça eu assinava embaixo, inteiramente: acho que finalmente começo à compreender e à absorver o "amor supremo" difundido por Coltrane; ainda sou meio "humano" e sinto que preciso de respaldo, de apoio pra continuar, seja qual for a missão. vícios não me servem: alcool é só diversão e não presta pra esse propósito. é como veneno. cigarros também. um leve vicio em café e coca-cola, mas não serve como apoio incondicional. religião, deus, buda, allah, krshna, kamisama, charles manson...? não. minha visão é mais mitológica do que sagrada... um outro dia explico essa parte melhor, enfim.

    e finalmente me sobra a música. a música serve como religião, partindo desse ponto. meu estado de espírito se retorce de acordo com o som que sai dos fones. me firmo como concreto e me afundo como em areia-movediça com a rapidez de uma faixa pulando pra outra. é tão grave que geralmente preciso escolher bem o som que vai me servir de trilha sonora em ocasiões: por exemplo, easy-listening pra ir trabalhar, punk rock pra pré-balada... e assim por diante. e se esqueço o mp3 player em casa... pode voltar pra trás!

    ***

    dia desses eu andava pelas ruas de Pinheiros, ainda úmidas pela chuva recente. 3 horas da tarde, aquele dia cinzento, menos quente do que frio, e Morphine rolando nos fones. o efeito foi incrível. de repente me pego pensando sobre minha vida de jeito que eu não pensaria se o clima fosse outro, se o lugar fosse outro, mas principalmente se a MÚSICA fosse outra. não entremos em detalhes sobre os pensamentos propriamente ditos: só sobre o efeito causado. o Morphine em especial me causa efeitos diferentes, o nome dessa banda não poderia ser mais apropriado; até já escrevi algo relativo num momento de "entorpecimento" causado pela combinação do THC, álcool, e do som de uma música em especial - Souvenir - que foi quase uma manifestação física do subconsciente. animalesco. bom, muitos outros me causam efeitos parecidos: Tom Waits, Portishead, Soul Coughing, Jesu, Godspeed You Black Emperor!, Massive Attack, ... mas Morphine é realmente um caso à parte; de como o som deles retorce a minha mente e espreme lembranças e reflexões.

    enfim, me fez bem. faz bem você ter a flexibilidade de pensar na sua vida de uma maneira que ela não aconteceu, mesmo que ainda um dia aconteça. faz bem a possibilidade. dessa forma caminhei, como faço todo dia até o ponto de ônibus. subi no ônibus, visualizei o caminho, desci no meu ponto e caminhei até o trabalho, como faço todo dia. mas o som muda o vislumbre de tudo, deixa tudo mais claro, mais nítido. você vê a beleza de detalhes que não veria de outra forma, você vê beleza no vento soprando forte o casaco de uma mulher, ou num balconista limpando o balcão sujo de cerveja do buteco, ou numa pessoa qualquer lendo jornal na parada do ônibus. tudo por causa do som. e isso é o APRENDIZADO, o SALMO, a PERSEVERANÇA e a RESOLUÇÃO: o verdadeiro amor supremo.

    curioso como o som de um baixo, sax e bateria fornece esses dados pra massa cinzenta. uma endorfina sonora... realmente foi uma pena o Mark Sandman ter empacotado tão subitamente; bom, pelo menos foi de um jeito legal: em cima do palco, no meio de um show. não deve ser melhor do que "com a cara enfiada no meio das pernas de uma bela dama" (essa estoria de novo...) mas é ok também! o Diamond Darrel do Pantera também morreu no palco, mas levar uma sapecada de tiros deve ser tão ruim sobre um palco como num beco em Diadema... ou seja: não faz muita diferença!

    hmm... aliás, como eu cheguei nesse assunto mesmo?...

    sobre frustrações e Husker Du

  • domingo, 22 de junho de 2008
  • Wash.
  • frustração é uma merda incrível mesmo, né.

    estava descendo a rua augusta pra encontrar um amigo. uma sexta feira dessas qualquer, muita gente na rua... como se diz: "a rua cheia de NINGUÉM", se é que me entende; no mp3 player, rolando Husker Du. adoro Husker Du, de verdade, é uma das minhas preferidas... mas não sei se Husker Du é apropriado pra se ouvir numa sexta-feira a noite indo pra um rolé. me entenda: o Husker Du foi uma das minhas grandes influências no meio musical alternativo. acabei ouvindo e decorando fase por fase que esse trio passou dentro do hardcore mais extremo ao pop mais "emo", pra se ter uma abrangência mais moderna e compreensiva do trabalho deles nos dias de hoje; mas dentro disso, uma coisa eu digo: quando eles resolviam serem deprês, eles levavam isso ao pé da letra!...

    enfim, a coisa toda culminou desse jeito: de repente eu tava descendo a augusta e de repente, mais que de repente, resolvi ir pra casa. o ônibus já tinha acabado. mas ok, fui a pé mesmo. nem pestanejei, preferi ir pra casa a pé do que ficar e encontrar meu amigo pra papear e beber mais.
    é assim: de repente você está bem, acha que está com seus problemas e temores sob controle, e de repente tudo muda com a intensidade de uma supernova. "boom" na cabeça e pronto, muda tudo. ir pra casa é a melhor opção nessa hora, sem falar com ninguém, só com seus pensamentos livres e diretos, só pra si mesmo. não é nada demais, life goes on e bola pra frente, amanhã é outro dia, porra!

    não que eu goste de ser "bipolar" assim comigo mesmo. de fato é quase um transtorno obssessivo-compulsivo, porra: você se influencia e se deixa envolver assim com seus próprios pensamentos de forma que muda seus planos já no meio do caminho. é foda, eu sei. mas é o meu jeito. eu sei que pode ser moldado, mas... ainda me falta um pouco de força de vontade. não me importo: quando eu cansar de bater com a cara no muro, de dar soco em ponta de faca... eu mudo. senão, a velhice se encarregará de mudar isso. por enquanto, i can't help myself. period.

    ***

    ah sim! a música era mais ou menos assim:

    "It's a great big world
    There's a million other guys
    I feel so lucky when I look in those green eyes
    Is it the sun that makes them so green?
    Those are the prettiest eyes
    I have ever seen

    Green eyes...

    What makes them sparkle?
    What makes them shine?
    What makes those eyes of yours look into mine?

    Green eyes..."

    sobre a falta do que fazer

  • sexta-feira, 20 de junho de 2008
  • Wash.
  • a minha idéia sobre ostracismo, sobre obtusão, sobre completa perda de consciência sobre o que é realmente importante; a minha idéia sobre o fim da expressividade social, sobre o FIM DA VIDA, enfim, é mais ou menos assim. vou descrever num acontecimento corriqueiro dos meus afazeres, dia desses:

    uma senhora aposentada, beirando lá seus setenta anos, aparente classe média-alta, me chama enquanto passo pela loja onde trabalho. corredor de massas para bolos e sobremesas:

    - o senhor trabalha aqui?
    - sim senhora, mas estou um pouco ocupado, vou chamar um funcionário para lhe...
    - me ajude aqui, por favor: essa gelatina é da royal, é de morango e tem 45 gramas.
    - isso, senhora.
    - e essa aqui é da marca própria, também é de morango e tem 85 gramas: qual é a diferença entre essa e essa?
    - basicamente nenhuma senhora. é que uma vem com mais açucares na mistura do que a outra...
    - mas isso é um absurdo!!! por que essa pesa mais que essa, se rende a mesma coisa? estou sendo roubada?? o modo de preparo é o mesmo das duas...
    - isso mesmo, senhora.
    - essa precisa de um copo de agua quente e um de agua gelada...
    - uhum, isso mesmo senhora.
    - e essa também, um de agua quente e um de agua gelada. o mesmo modo de preparo. isso assusta, não???...
    - pois é, senhora... (???... isso assusta???)
    - isso é muito errado! voces precisam entrar em contato com esse fornecedor que manda menos ingrediente e obtém o mesmo resultado! isso pode ser corrigido pelo INMETRO!
    - claro senhora. isso será providenciado...
    - bom, eu vou levar a de 85 gramas. acho que por ter mais volume, é melhor.
    - faça isso, senhora.

    ***
    pois bem. voltei aos meus afazeres normais dentro do trampo. olha, não que meus afazeres sejam os mais importantes do mundo: eu tenho que balancear contagem de estoques, ver quantidades faltando, como sumiram, porque sumiram, qual será o prejuizo geral no balanço mensal; enfim, é um trabalho. muita gente faz MUITO MAIS que isso durante o dia. MUITO mais. ao mesmo tempo, de repente é até mais importante do que o da pessoa que é responsável pela quantidade de açucar que vai no pó da gelatina, sei lá, foda-se o pó da gelatina... mas mesmo assim é obsoleto. tudo é relativo. talvez até a importância de relatar isso ou a importância que eu estou dando pra esse comentário sejam relativos, sejam mediocres e obsoletos. mas meu deus, parei por um momento e fiquei pensando MUITO sobre aquilo que aquela velha disse: "...isso assusta, não?"

    ...cara. como pode chegar a FALTA DE OCUPAÇÃO na vida de uma pessoa, que um dia já foi socialmente ativa, a ponto de se ter ISSO como preocupação?? isso como motivo de espanto!!... "isso assusta", ela me disse. juro que ela me disse nessas palavras.

    conclusão #1: assim me sinto importante... de boa, viu.
    conclusão #2: quero morrer com 50 anos. 55, talvez.

    em breve mais momentos de muita ação e aventura...

    sobre ficar mais velho

  • quarta-feira, 4 de junho de 2008
  • Wash.
  • vamos exemplificar da seguinte forma - uma forma coerente pro meu mundo, enfim: me sento encostado num balcão, em algum buteco sujo da Augusta. a Augusta já foi mais suja do que é hoje em dia, mas foda-se... ainda é um bom exemplo. enfim, no balcão do buteco um tiozão escroto senta ao meu lado. ele é o TEMPO. usa uma camisa de botões quadriculada de péssimo gosto, desabotoada até o meio da barriga. correntes de ouro no pescoço, esverdeadas pelo zinabre que sai do suor e do sebo na sua nuca. uma calça de sarja velha presa por um cinto de couro que desaparece sob a banha da barriga que desaba partindo do meio do peito. ele senta ao meu lado e seu cheiro é acre, arde as narinas pelo suor forte que ele exala. isso mais o mofo e naftalina das roupas me provocam uma sequência de três micro espirros. prendo o nariz pra que eles cessem.

    o senhor TEMPO senta ao meu lado e me encara, com um sorriso cheio de dentes amarelos. um "hehe" gordo desprende um hálito de camelo daquela garganta milenar. pede um rabo de galo pro balconista e manda na golada. pede outro. ele se vira de novo pra mim e balbucia uma sequência de silabas e perdigotos no meu rosto: "é o começo do fim", ele diz. "o que você tá achando?"... "vai aguentar?? vai pedir arrego??"
    "um dia o fim tem que começar, porque não hoje??" eu respondo. e não, não tenho medo. não tenho nada a favor, não tenho nada contra. em volta do buraco é só beirada, e partir daqui de cima é só ladeira! let it come! solta os seus leões na arena cheia de cristãos! manda vir que ainda estou de pé. acho que não te devo nada, nenhum centavo, tiozão. ainda estou na atividade, ainda sinto o vento na cara. enquanto tiver boca pra falar e olhos que enxergam no escuro, pernas pra correr e braços pra proteger do impacto, enquanto eu tiver um cérebro e souber usa-lo de uma forma minimamente coerente... tou aqui. só jogo a toalha hora que não tiver nada disso, e pro inferno essas ideias que "vão tentar puxar o seu tapete" porque... simplesmente não dou motivo pra NINGUEM querer fazer isso! esse foi o grande truque que você me ensinou, tiozão; esse foi no naipe do Houdine! o Robert DeNiro do Scorsese!... wakatá?

    o tiozão fecha a cara e ajeita a bunda gorda no banquinho minimo; "boto fé", ele balbucia de novo. "chico... bota um rabo de galo pro minino aqui. na minha conta"...

    sobre o sexo

  • terça-feira, 13 de maio de 2008
  • Wash.
  • o sol passado da metade do céu, e eu na frente do computador. não dá pra romantizar isso, eu sei. geralmente é uma cena cretina, eu na frente do computador. pronto: o tempo passa e você não faz nada. pronto. se não ficar ligado, já está na hora de sair pra trabalhar.

    ela deitada na cama. ela sempre acordava tarde; levantava, se olhava no espelho, fumava um cigarro e ocasionalmente comia alguma coisinha. voltava a se deitar na cama, com a preguiça de uma leoa sob o sol incandescente da savana. se esticava toda, de camiseta e calcinha. gemia pra esticar os quartos das coxas e voltava a cochilar. ou só ficava deitada mesmo, olhando ao redor, vendo o tempo passar. o amanhã é só daqui uns meses, uns anos, e é como se hoje ela tivesse esse tempo pra ver o tempo passar. a tranquilidade é uma porra de um dom divino, bote fé...

    me vesti. fui até a cama e anunciei minha saída de novo, disse que me atrasaria pro trabalho se não saisse agora. lhe dei um beijo, suave, doce. ela me devolveu um beijo forte, violador, lascivo, com o braço em torno do meu pescoço forçando pra que eu me abandonasse em direção do colchão. sorrindo eu desenrolei o braço ofídio de volta do meu pescoço, disse mais uma vez que iria me atrasar se não saisse naquele momento. passei pelo banheiro pra um relance no espelho. voltei pelo quarto e fui em direção da porta. ao som da primeira volta da chave ela me chama. "vem aqui pra cama... não vai agora", aquela voz suave e no cio ecoou, correu em ondas pelo quarto e bateu no meu ouvido. mais uma volta da chave e a porta pra rua estaria aberta, mas o som daquela voz e o cheiro do cio no ar seguram minha cabeça, quase com mãos físicas, e forçam-na a virar. o ouvido e o nariz já estavam fisgados, faltavam os olhos.

    ela se retorceu como a leoa, cada parte do corpo em evidência, cada pedaço da pele de veludo já queimava, se contorcia com o tesão que já destruia sua calma. que calma que nada!, só queria saber de exalar aquele perfume de sexo, de se contorcer de calor no colchão, de me atrair do jeito mais isntintivo que fosse necessário. seus joelhos se reviraram pra baixo e as coxas arquejaram. a bunda estampou acima do resto do corpo contorcido, o rosto encostado no colchão e aquela bunda lá no topo. de tanto se retorcer a camiseta regata já não tapava aqueles seios macios de petala de papoula branca; eu já havia provado aqueles seios milhares de vezes, mas era como um doce que a gente nunca acha tão doce assim e sempre volta a se empanturrar. "vem pra cá", ela chamou de novo, e esticando o braço pra trás, puxou um dos lados da calcinha de algodão que moldava seu sexo e mostrou todo aquele tesão flutuando como uma aura. é quase visivel, a aura de tesão em volta. e pronto, prendeu os olhos, os unicos que ainda incoerentemente resistiam. sem emitir nenhum som ela ainda dizia "resista! vamos, resista até onde pode, resista inutilmente..."

    hipnotizado, sem olhar pra fechadura, eu revirei a chave pro lado contrario de volta ao trinco. sabe quando não dá tempo pra pensar e você já está em outro lugar quando pisca os olhos? num estalo e eu já estava com o rosto enterrado no traseiro dela, me esfregando, me fartando com o cheiro do cio, lambuzando toda boca, o nariz, a maçã do rosto, a lingua descontrolada querendo fugir, querendo aproveitar mais que tudo toda aquela seiva, aquela pele, aquela carne... aquela alma que acumulava milhas de impureza.

    me vêm aquele pensamento na cabeça de novo: "é aqui que eu gostaria de morrer. queria ter um ataque do coração agora e cair duro, ah!, isso sim é um belo dum jeito de morrer!". já havia pensado nessa possibilidade em algumas vezes anteriores, e até mesmo quando não estava trepando. na rua, no trabalho. na verdade aquele momento sempre drenava um pouco da minha vida, e de fato a gente acaba gostando daquilo. não de sexo, isso já é óbvio: da vida se esvaindo assim. um tipo de vampirismo, sei lá. você sabe que um pouco da sua vida foi drenada naquele momento, e é fudido de bom. deve ser fudido mesmo morrer desse jeito, deixar o momento drenar toda sua vida de uma vez. conheci um cara que morreu assim, com a cara enfiada no meio das pernas da amante. que morte feliz e completa ele deve ter tido...! isso fez dele um pouco herói pra mim, um cara que merece minha admiração pra sempre.

    num estalo eu volto ao ato. já me vejo soltando o cinto da calça com uma mão. a outra mão ocupada, os dedos explorando aquela buceta que poderia ser um altar pras minhas preces, com genuflexório e tudo que se tem direito num reverenciamento. senti sua lubrificação ficar intensa. ela se retorce mais ainda sob meus dedos, o tesão agora só pode ser controlado de um jeito: com minha calça prendendo meus pés, se equilibrando sobre as ancas dela com o pau enterrado até onde é possivel. "não pense, não caia, só foda". um animal explodindo na cabeça, descontrolado pelo cio da femea, matando toda racionalidade à paulada se for necessário. segura as ancas dela com força, faz ela gritar! faz ela urrar, caralho! faz ela pedir pra se gozar toda!... assim a cabeça ordena e a boca imita.

    o delirio de um ato instintivo assim não pode ser descrito com exatidão racional. é descarga massiva de endorfina no cérebro. é 250 milivolts produzidos pelas paredes vaginais. é nicotina, valium, vicoden, marijuana, ecstasy e alcool tudo de uma vez, e tudo isso não é nada comparado ao gozo pleno. ela grita e se comprime em meu torno, convulsiva me xinga de tudo que é baixo e bom. "se acaba, filhadaputa! se goza toda!" eu grito em seguida, alucinando um turbilhão que sai com o fluido do meu corpo. "agora sua vez, goza muito, caralho! quero ver você derretendo" ela grita pra mim, enquanto meu cerebro é colocado numa maquina de lavar com morfina como alvejante.

    um apagão. um minuto pra recobrar a racionalidade, pra voltar ao mundo que o consome. eu sento na cama e por uns minutos tomo folego pra me vestir. mais uns segundos recobro a memória que agora estou TOTALMENTE ATRASADO pro meu compromisso. dou um beijo nela, que continua deitada e ofegante, mas com a satisfação de um junkie pelo "fix" estampada no rosto. saio pela porta correndo e vejo de raspão, de relance, um último olhar dela que também não tem explicação: só é bonito. só é beleza, mais nada.

    ***
    passo apressado pela rua com um sorriso no rosto, e mesmo todo descabelado noto olhares femininos em minha volta. o cheiro do sexo ainda está em mim, todas elas sabem; só não vêem com os olhos, mas sentem. sabem que tem algo ali que atrai a atenção. um cara ordinário, até feio: o que tem demais nele??...

    pois sigam seus narizes, belas senhoras. seus olhos só as enganam...

    sobre o cemitério de pombos

  • segunda-feira, 5 de maio de 2008
  • Wash.
  • esses dias eu tava rolando uma idéia old school com meu caro amigo igualmente old school Daniel Discarga (também atualmente conhecido como Daniel Reggaeiro Safado, mas isso não vem ao caso...) Enfim, falavamos de coisas que a gente passa na vida, coisas normais, coisas doidas; "cara!... a gente viu um cemitério de pombos, poh!"... ele falou. me deu um estalo e lembrei dessa porra toda muito escrota que rolou de cemitério de pombos.

    a gente tava em Barcelona. era fim do rolé da tour de 2005 do Discarga / I Shot Cyrus então depois do último show eu e meu amigo Daniel resolvemos ficar por lá um tempo, tentar a sorte, arrumar um trampo, sei lá, qualquer coisa. tentar dar um giro na vida de novo é sempre bom, se você não sabe ainda vai saber que é bom dar esses giros na vida. sair do eixo. enfim, demos uma fuçada nos contatos que tinhamos por lá e descolamos um canto num squat em Badalona, zona leste da cidade. cara, você passa por squats em vários cantos da europa, e em cada canto tem um estilo de se manter um squat: na Alemanha eles são super limpos e organizados, por exemplo. tudo no lugar, tudo limpo, varrido, despensa de comida organizada, turnos pra lavar louça, colchões "meio limpos"... é tudo catado por aí, então de quaquer forma NUNCA vai ser 100%. mas os alemães deixam tipo no 70%, vai... agora tem outros cantos que é triste. triste. e em alguns cantos da Espanha, é beeeeem triste. pois bem: esse lugar era um Ian Curtis de tristeza, digamos assim...

    potz, era sujo. era muito sem recursos, não rolava um bom esquema de limpar, não rolava recurso pra limpar. não tinha água encanada no banheiro, portanto usar a privada era impraticável e tomar banho nem pensar. eu tenho uma certa paranóia com banhos, tenho que tomar banho e lavar a cabeça todo dia, se possivel mais de uma vez por dia. nesse lugar eu fiquei duas semanas sem poder tomar banho. não tinha como cozinhar também, no máximo fazer um chá quente. no quarto que a gente descolou não tinha iluminação, então tinha que se virar pra ler ou arrumar as malas ou conversar até antes de escurecer, porque depois era só pra dormir mesmo. as janelas e a porta estavam quebradas, então a corrente de vento era contínua. um vento de gelar os ossos, já que o inverno se aproximava, em dezembro. era um sobrado abandonado e a parte ocupada era no segundo andar: o primeiro andar era uma montanha de lixo. pra se ter um idéia, o passatempo da galera do squat era acertar ratos no quintal forrado de lixo com uma arminha de chumbinho.... cara, depois que eventos assim estão guardados no passado, até que é divertido lembrar. mas viver o presente disso é tenso. foi tenso. um dia acordamos com o pessoal do squat marretando uma parede, invadindo o predinho abandonado ao lado. eram várias casas enfileiradas numa rua, todas abandonadas; não se sonha com coisas assim aqui, mas lá rola bastante. com a marreta eles abriram um buraco pequeno na parede e entraram. seguimos por curiosidade, pra ver no que dava...

    lá dentro da casa tudo estava no lugar. na cozinha existiam mesa e cadeiras dispostas em volta, um fogão e uma geladeira, um armário com louça lavada dentro... tudo recoberto com uma camada absurda de pó, mas tudo organizado. peguei um jornal em cima da mesa, com cara de que fora abandonado lá na mesma época dos outros objetos. a data do jornal marcava março ou maio de 1991, se não me engano. não conseguia acreditar que aquilo tudo estava ali abandonado por tanto tempo, sem ninguem requerer ou reivindicar a posse daquilo.
    da cozinha passamos por um corredor que dava num quarto, com tudo no lugar também: armários com cabides e roupas penduradas, uma cama de madeira de lei com um colchão de mola enorme sobre, e com alguns raincoats jogados também. da janela dava pra ver uma sacada podre, que provavelmnete desmoronaria à menor pressão do pé. nem arrisquei. o gran finale foi tentar entrar na sala. estava muito escura, não dava pra enxergar o chão onde se pisava, curiosamente fofo e com uns galhinhos que estalavam ao peso do corpo. um de nós conseguiu, andando sobre esse chão "orgânico", chegar até a janela e nos livrar um faixo grande de luz, pra nossa desagradável surpresa: o chão da sala estava forrado por carcaças de pombos, dezenas delas, talvez mais de cem, por todo o assoalho. estavam ali a tanto tempo que as carcaças estavam ressecadas, mumificadas, só existiam ossos e penas espalhadas pelo chão. só não foi pior por isso: não existiam mais visceras ou orgãos internos, nem tampouco os vermes que devem ter devorado tudo ha muito tempo. acho que eu teria vomitado. a atitude de todos foi enrolar a camiseta na frente do nariz e da boca, afim de evitar qualquer possivel contaminação daquele palco de cadáveres...

    saimos todos de dentro da sala, e da casa. eu e Daniel não voltamos naquele lugar, alias nem os punks que marretaram a parede creio que não tenham voltado, porque realmente foi uma imagem chocante. não teria condições de limpar aquele lugar, então acho que eles desencanaram... agora eu vivo pensando: como aqueles pombos todos entraram ali? e como não conseguiram sair, e morreram todos ali? e o que teria feito aquela casa ser abandonada assim, aparentemente de um dia pro outro, e talvez às pressas? ...sei lá. o caso é que no dia seguinte acordamos de manhã, antes de todos, arrumamos nossas malas e vazamos dali, sem nem nos despedir de ninguém. fomos pra casa do Guille e do Miqui, sem nem avisar direito. ali ficamos por mais uma semana e depois fui pra casa de um amigo no lado norte da cidade e o Daniel foi pra Belgica. decididamente, Barcelona pode ser muito mais interessante do que ir nas baladinhas noturnas de gringos ou passear nos Gaudis da cidade, hehe... ocasionalmente quando penso em coisas bizarras que já vi, me lembro da casa com um cemitério de pombos na sala. não deve ter sido a pior coisa que eu já vi, mas dá pra entrar fácil num Top 5, digamos.
    ai ai... me deu fome. acho que vou procurar algo pra comer agora.

    sobre linguados

  • quinta-feira, 1 de maio de 2008
  • Wash.
  • você já viu um linguado?... é, aquele peixe marinho que fica no fundo arenoso do oceano, meio que submerso numa camada fina de terra pra dar seus botes em peixinhos desavisados e outros seres semi-insignificantes que transitam despreocupadamente em sua volta... sabe? então. noutro dia eu tava olhando esse peixe. tava detalhando o formato dele. ele é visualmente um peixe achatado, um formato ideal pra se enterrar na areia e esperar, acomodado ali. mas se colocado verticalmente, como os outros peixes que vagam nadando, ele tem um detalhe bizarro: ele é um peixe comum de um lado - com escamas, barbatanas e nadadeiras, boca, guelra, orificio nasal, e os incomuns dois olhos do mesmo lado da cabeça... e do outro é como se fosse apagado! como se uma criança desenhasse só o CONTORNO de um peixe num papel; é EM BRANCO, não tem nada, olhos, barbatanas, escamas... nada. só o contorno da boca.

    agora a minha dúvida é a seguinte: como isso aconteceu??... a partir de que momento no ciclo evolucionário esse bicho resolveu deitar no chão e APAGAR um lado inteiro do corpo? e como um dos olhos PASSOU pro outro lado da cabeça??? foi assim, "ploft", de um dia pro outro? ou foi lentamente, de filho pra filho, cada geração um pouquinho mais pra esquerda, um pouco mais, um pouco maaais...? pegadinha de deus, esquema "serginho mallandro fisstaylle"??? yep. acho que pior que essa, só a do ornitorrinco...!

    só uma viagenzinha; coisa de quem tem tempo pra ficar pensando em nada, eu acho. acho que os antigos filósofos tinham MUUUITO tempo vago.

    enfim...

    sobre viver ou morrer

  • terça-feira, 29 de abril de 2008
  • Wash.
  • foi o próprio Jeff Buckley que deu indícios, na música "Grace", que já estava preparado pra morte. ele tinha 30 anos e tinha uma iniciante carreira promissora, então nem sei bem se acredito nisso também, mas pro cara dizer coisas como "minha hora está chegando e eu não tenho medo da morte" ou "eu sinto eles afogando meu nome"... cara; alguma coisa ele já sabia. ou já planejava, já que até hoje é um mistério como ele se afogou. o corpo dele encontrado numa margem lamacenta do rio mississippi, uns kilometros à frente, alguns dias depois: pode ter sido acidente. pode não ter. enfim, a morte estava ali presente, quase fisicamente.

    ela te faz pensar. já pensei na morte muitas vezes. quando se é uma criança e se descobre o que é a morte, é bem assustador. primeiro porque naturalmente temos medo do desconhecido. as coisas que vêm à cabeça de uma criança normalmente são confusas, então juntando A+B, o medo dobra. triplica. quadriplica, e o dobro disso. o medo da morte era tão forte em mim que eu não conseguia dormir; certa época fiquei uns 40 dias sem dormir direito pensando nisso, e sinceramente não é lá muito sadio pra uma criança ficar pensando na morte. mas às vezes eu acredito que foi bom descobrir cedo sobre a morte e seus mistérios; isso dá tempo suficiente pra trabalhar a cabeça, e por mais misteriosa que continua sendo o que há depois da morte, você chega à simples conclusão que ela é normal, faz parte da vida. e é inevitável. o pior mesmo é a eterna curiosidade felina que atormenta a todos: qual será o dia que ela vai chegar?...

    aprendi a não me preocupar com isso também. o dia que ela vier é porque é pra ser, é porque tá na hora. tá lá, escrito. tampouco me importa qual será o dia. o importante é não deixar de viver até o dia chegar: viver por viver é menosprezar o que a vida te proporciona.

    eu já vi um homem morrer. na prática, morrer é só deixar de viver, não fosse o sintoma de especismo que te passa desapercebido; eu digo isso porque você já deve ter visto um inseto morrer, uma lesma morrer, uma planta morrer, um rato, até um animal maior como um cachorro ou um cavalo morrendo. mas um homem morrendo.... sei lá, é diferente. mexe com você, instintivamente. é seu semelhante, pode acontecer com você também. poderia ser VOCÊ ali agora, mas foi ele. tudo isso e mais um monte de coisas faz você pensar muito, durante dias, até se cansar e voltar a não se preocupar com isso. por isso a morte faz parte da vida.

    ele trabalhava comigo, na época. eu era um garoto, 17 anos, não tinha visto muita coisa ainda, acho que não tinha visto nem uma mulher pelada ainda na minha frente, então imagina que era um cabaço mesmo, um cabaço pra vida. mas não foi vacilo meu, eu só presenciei, então isso não me traumatizou nem me causou problemas. pra mim, foi só uma experiência. enfim... eu trampava com desenho mecanico numa empresa de pequeno porte, uma metalúrgica, e esse cara era só um encarregado de serviços gerais, um quebra galho geral, pode se dizer. naquele dia eu almocei e fui sentar debaixo de uma varandinha, pra observar o movimento do trânsito e pessoas que circulavam na calçada, enquanto rolava a digestão. esse cara subiu no telhadinho que fazia minha sombra e começou a consertar um vazamento na telha, sem notar com muito cuidado um desse pinos de porcelana condutores de energia, não sei o nome dessa joça, que puxa a eletricidade do poste da rua pra divisora interna da fábrica; ele lá trabalhando no vazamento e eu sentado, observando os carros. de um momento pro outro ouvi aquelas onomatopéias que usam em efeitos sonoros para filmes, aquelas que indicam uma descarga elétrica, tipo "bzzz bzzz bzzz"!! bem forte, e pelo canto dos olhos na nuca vi fagulhas de fogo e um calor intenso nas costas. tudo isso foi cerca de 3 segundos, o que dá tempo pra instintivamente se levantar correndo, dar uns 5 ou 6 passos e olhar pra trás pra entender o que está acontecendo: vi o cara fritando por mais 2 segundos no máximo, e a corrente elétrica foi bloqueada automaticamente, livrando o corpo dele pra cair pesadamente no solo, como um fantoche, como um boneco de pano. o que rolou pra isso acontecer foi surreal: no momento que ele consertava o telhadinho, a estática da energia que passava pelo pino de porcelana foi tão grande, tão forte, que puxou o cabelo dele - de meio corte no pescoço - e foi o cabelo o único condutor da eletricidade à passar coisa de 18 mil watts pelo resto do seu corpo. ele fritou. só não virou um carvão porque a corrente caiu, foi interrompida.

    ele bateu no chão. me lembro dos olhos dele, esbugalhados, abrindo a boca pro último expiro de puro gás carbonico, que saiu em forma de leve fumacinha branca. indicou que por dentro ele cozinhou. um cara que passava na rua na hora correu pra socorre-lo com massagem cardiaca e respiração B-A-B, eu corri pra dentro da portaria, liguei instantaneamente pro resgate. foi o que deu pra fazer, foi o que eu soube fazer e foi o que consegui pensar em fazer naquela hora. mas acredito que aquela fumacinha branca foi o último respiro de vida que o corpo dele deu: quando o resgate chegou ele já estava morto. foi fulminante.

    sinto até que invado um pouco a privacidade e a memória in vita do cara; mas essa imagem faz parte de mim agora. eu me apropriei. na polícia tudo ficou esclarecido e comprovado que foi um acidente de trabalho, creio que a família dele tenha sido indenizada por isso. é estranho que não me lembro do rosto de muita gente dessa época, nem tampouco de muitos afazeres que eu desenvolvia. pior ainda: nem me lembro do nome dele. e nem sei se ele estava preparado pro seu último dia. mas nunca vou esquecer o rosto desse cara, e seus olhos estalados, fixos no nada, em seu último minuto. foi o dia que eu vi a morte.

    sobre terremotos

  • quinta-feira, 24 de abril de 2008
  • Wash.
  • o povo daqui é meio "afobado" quando se trata de alguma coisa nova na rotina diária. um terremoto, por exemplo. por mais absurdo que pareça, acho que nunca se deve descartar que, de fato, eles podem acontecer. aviões caem: acontece. macacos raivosos atacam pedestres em ruas urbanas: acontece. padres tentam bater recordes de vôos em balões de hélio e desaparecem em pleno oceano: ACONTECE!... e porque terremotos em placas fixas tectônicas não podem acontecer? só porque são fenômenos naturais não causados pela ação humana?... bobagem: isso não existe mais, então ACONTECE sim! as pessoas deveriam se acostmar com a idéia de terremotos em São Paulo sim, deveriam achar normal, corriqueiro, deveriam obter o hábito de se esconder debaixo das escrivaninhas e carteiras escolares como os japoneses; como o cara do noticiário disse, faltava isso pro Brasil entrar no plano dos países de primeiro mundo: agora só falta nevar em Belém do Pará...

    minhas experiências com abalos sísmicos foram agradáveis. não estou sendo cruel, muita gente já morreu com essa porra; mas os 3 ou 4 terremotos que presenciei foram fracos, na mesma média desse que rolou em São Paulo. o primeiro foi nos primeiros dias que cheguei no Japão, em 98. já tinha visto trem-bala, kogarus e bossozokos... só faltava o "dishim". foi um pouco decepcionante. foi fraco, nem lembro o que eu fazia na hora, foi mediocre, tipo uma azia comum, daquelas que só balançam o estômago. botei em jogo todo aquele "auê" que faziam sobre terremotos que destruiram cidades inteiras, como o de Kobe... pensei até se aquilo não teria sido uma bomba norte-coreana ou algo assim. é uma visão meio cretina da situação, afinal se já de cara eu pegasse um de 8 graus na escala Richter, eu já empacotava ali mesmo. e isso não é uma maneira feliz de presenciar um terremoto; mas um mês depois veio um bem massa: eu tava no supermercado com uma cestinha na mão comprando pão e coisinhas, e o chão deu uma "saida" do lugar. as prateleiras bailaram levemente na minha frente, os potes de vidro fizeram aquela musiquinha batendo uns nos outros. travei seco. ali não passou uma agulha, um grão de areia. olhei pros lados pra ver a reação dos japas, porque a minha já estava a ponto de largar a cestinha no chão e sair correndo porta afora, como se isso resolvesse merda... mas tive o bom senso de olhar pros japas e eles, friozinhos como são, continuavam seus afazeres como se nada acontecesse. relaxei o esfíncter e fiquei de boa de novo. mais tarde eu descobri que se alguns vidros começassem a cair pelo chão, um pequeno caos teria se instaurado; só assim eles se desesperam. enquanto não cai nada no chão, os japas dizem "shimpaishinai". nesse dia cheguei de volta do supermercado e a nilce tava branca, com os olhos arregalados, dizendo que tinha dado um pulo da banheira na hora e por um minuto a mais não sai correndo na rua só de toalha... teria sido engraçado, pelo menos.

    a terceira experiência foi pseudo-lisérgica. eu tava dormindo e pensei que aquilo estava sendo um sonho, ou um diabo parecido, quando ouvi a casa ranger toda toda a madeira e as prateleiras balançarem inteiras. essa vez foi a mais assustadora porque à noite você não tem noção de NADA que tá rolando, nem sabe o que fazer, pra onde correr no escuro... é foda! mas foi só um balanção, nem passou disso. depois desses, vira-e-mexe eu sentia vários de menor intensidade, nem dava muita bola. mas passei a acreditar que essa porra pode destruir uma cidade inteira só com uma espreguiçada. a grande sorte da humanidade é que esse planeta deixou de ser cruel já ha alguns milhões de anos. trocando em miúdos, ou exemplificando de uma forma bem vulgar, a terra "peida" e as pessoas já tremem na base: o dia que a terra tiver uma diarréia brutal, todo mundo vai pra merda. literalmente.

    sobre o rádio

  • segunda-feira, 14 de abril de 2008
  • Wash.
  • Engraçado como certas coisas somem do dia-a-dia da gente. Você tem uma rotina (algumas rotinas podem ser legais! pode acreditar...) e está habituado a fazer aquilo todo dia, e de repente um ponto dessa rotina vai sumindo, inexplicavelmente. o rádio, por exemplo: o rádio fazia parte da minha vida durante vários anos e, de repente, ele sumiu. desapareceu. não ouço rádio desde 94, quando a Brasil2000, a última (e única) "college radio" de São Paulo mudou sua programação pra uma coisa mais "ordinária" ao costume diário juvenil de massa; ou seja: passou de fudida pra uma merda inaudível. sabe o que é vc ligar o rádio em casa, no trabalho, no carro, pra ouvir Husker Du, Fugazi, Gumball, Jesus Lizard, Lemonheads na programação normal??!! e no dia seguinte você sintoniza a mesma estação e tá tocando Charlie Brown Jr, Skank... Alexandre Pires!!!... você tem uma grande decepção, pra não dizer uma porra de um ataque.

    Acho que sou da última geração que conheceu o rock via FM. depois da minha, já começou a internet. e hoje é o mundo que conhecemos, nem preciso falar disso. me lembro que comecei a ouvir rádio, como todo garoto de perifeira, na cozinha de casa no radinho da mãe, que a acompanha no dia de trabalho dentro de casa. um tempo depois meu pai me comprou um gravador de fita cassete com rádio e dai comecei minha aventura particular pelas sintonias das FMs de SP; passava mais tempo com o rádio do que na tv, ou até mesmo brincando na rua. daí pra ir pegando gosto pelo rock, metal, punk, foi tudo gradativo. e em função principal do rádio. descobri a 89FM, logo no seu comecinho, e era fudida: o programa Trip89 do Paulo Lima (da revista TRIP) era um dos meus preferidos, junto com o Comando Metal do Vitão Bonesso, nos domingos à noite. ouvia e pegava todas as novidades. óbvio que não era tão fácil como hoje em dia, que é só entrar no soulseek e baixar tudo: anotava o nome da banda e o play, ia na galeria e procurava o LP, comprava e ouvia em casa. era dificil, mas era um rolé curtido.

    O próximo passo foram os programas da madrugada da 89: os programas do Kid Vinil, o Caixa Preta do Sérgio Sá Leitão e o Rock Report do grande reverendo Fábio Massari. foi quando eu comecei a virar um insône...! e com esses 3 programas eu simplesmente pulei de U2 e Midnight Oil pra Stooges, Replacements, Unsane, Osrich Tentacles, Jon Spencer Blues Explosion, Ministry... foi uma evolução fudida!

    Paralelamente nessa época, minha programação diária do dial era a Brasil2000 mesmo. horário comercialzão e os caras rolando MC5, Fugazi, Big Black, Sonic Youth... inconcebível pra uma rádio hoje em dia. uma vez eu tava no trânsito fudido e os caras meteram uma coletânea da Rhino de ponta a ponta, só de punk classe A, as 3 da tarde: Husker Du do primeiro disco, MDC, 7 Seconds, Misfits, Dickies, Minor Threat, Circle Jerks, Germs... cara, abri a janela no meio do trânsito e botei o som a fuder. foi animal. é um desses momentos particulares que não se esquece nunca. e isso tudo, pasme, numa rádio.

    Nessa mesma época eu descobri, meio sem querer, que rolava um programa chamado Garagem (acho q na Cultura FM...!) encabeçado pelo jornalista André Barcinski. eu já conhecia as opiniões dele sobre rock desde a revista Bizz: meio que um paga-pau do Lester Bangs no quesito "expressão escrita"... mas o gosto do cara não mudava por isso: odiava o Dio e idolatrava os Ramones. pra mim é o suficiente. e foi nesse programa que eu ouvi o melhor rock/punk/hardcore e que até então eu não conhecia 80% das bandas. minha evolução musical graduou daí em diante. se bem me lembro, esse programa não durou muito tempo na emissora porque os caras botavam umas promoções escrotas pros ouvintes do tipo "mandar dono de gravadora se fuder"... e mesmo com uma boa audiência - talvez a melhor da emissora - o programa saiu do ar. voltou anos depois na Brasil2000, mas aí eu já tinha desencanado do rádio e não consegui voltar a ser um ouvinte assíduo. coisas da modernidade. culpa da internet, provavelmente, que deixou todos nós "malacostumbrados" com a facilidade. por exemplo, ontem um amigo me perguntou de uma música antiga do Big Boys; eu entrei no site da amazon, descobri que música era, entrei no slsk, baixei o som e mandei pra ele pelo msn: "essa mesma!", ele disse. tudo isso em 10 ou 15 minutos. e o que dizer sobre o rádio??? ...você ouve rádio?...

    daí não tem como competir, né...

    sobre a memória

  • domingo, 16 de março de 2008
  • Wash.
  • "se a minha memória tivesse data de validade, seriam de 10 mil anos..."

    essa frase é dita por um personagem do filme Chunking Express, de Won Kar-Wai. devo ter assistido esse filme pela primeira vez há uns 10 ou 11 anos atrás, mas até hoje essa frase retumba e ecoa na minha cabeça. não é por algum momento especial que eu tenha passado na vida até aqui. mas pelo que ela resume pelo que ela dá significado. às vezes parece que a quantidade de lembranças é tão vasta que é quase impossível ter vivido aquilo tudo em apenas uma vida... eu não acreditava nisso, assim como em muitas coisas em que hoje acredito, mas é verdade. é real. o corpo é uma formiga e a memória é um elefante.

    percebo isso quando as pessoas me perguntam "o que eu fazia antes disso?"... aí vêm um suspiro longo e a resposta imediata é sempre: "muita coisa. já fiz muita coisa na vida"...

    à primeira vista pode parecer alguém perdido, tentando dar um sentido na vida pra si próprio, escrevendo desse jeito. mas daí, depois de contar algumas (eu disse algumas, não todas) coisas que eu já fiz, o ouvinte sempre solta a mesma sequência de expressões: "nooossa! quanta coisa!!"... e em seguida vêm aquela: "e depois de fazer tudo isso, o que vc tá fazendo aqui?"... daí a resposta não vêm de imediato. eu sempre penso pra responder isso, ela entala um pouco. às vezes é "não sei... sinceramente!"; e às vezes é "c'est la vie!"... vai muito do dia, ou da minha animação.

    o mundo dá voltas. ontem mesmo eu tava tentando me lembrar qual foi a primeira vez que eu passei na rua que eu moro, e porquê. daí lembrei que poderia ter sido em 1994, ou 1995, com alguns amigos. mas de instantâneo mudei a resposta. eu não me lembro de ter visto essa rua a primeira vez que passei nela: eu havia acabado de nascer, logo ali, no hospital acima.

    e eu já fui e voltei. e fui. e voltei. ainda estou aqui e logo me vou. mas sei que vou voltar, sem ainda saber o significado disso, mas sei que sempre vai ser assim.

    sinto falta de momentos, sinto falta de pessoas e de lugares. sinto que queria estar longe e quando estou longe sinto saudade daqui. sinto que queria dar um sentido novo pra minha vida, toda vez que tenho a sensação que me falta um braço ou a cada momento que o coração incha de dor e parece que vai pular pela garganta. mas é tudo como um ônibus que faz uma linha circular; eu pego esse ônibus e sempre dou sinal pra descer no mesmo ponto. e a verdadeira maldição de ser o único animal que acidentalmente desenvolveu inteligência é ter ganhado de presente a memória, pra sempre voltar a pensar em tudo que já se fez até aqui; pensar que a vida é relativamente curta pro tamanho da memória destinada. e pensar que ainda tem mais...

    c'est la vie.

    sobre Portishead e writer's cramp de novo

  • sábado, 15 de março de 2008
  • Wash.
  • as palavras não vêm. cãimbra de escritor de novo.

    por enquanto só fica na cabeça a fala em português que abre o terceiro e recentíssimo disco do Portishead: "esteja alerta para a regra dos 3. o que você dá, retornará pra você. essa lição você tem que aprender: você só ganha o que você merece..."

    volto logo.