lavador de pratos #1

  • quinta-feira, 27 de agosto de 2009
  • Wash.
  • e o lavador de pratos voltava para casa, cabisbaixo, cansado de mais um desses dias transbordantes de intolerância sobre aquele trabalho de futuros incertos. "que diabos eu estava pensando quando eu disse "olá"?, ele dizia pra si mesmo, enquanto repaginava mentalmente suas fotos mais especiais, e se colocava por detrás das lentes, como um narrador em terceira pessoa, pra tentar lembrar melhor o que o fotógrafo em questão via ali, naquele momento único, e se fazia parecer com um espião, um intruso de seu próprio passado.

    uma coisa o incomodava sobre as fotografias: se colocando em seu lugar, no lugar adequado como o figurante-foco da foto, ele nunca se lembrava de como foi parar lá, naquele lugar. e não se lembrava de como estava a pessoa que apertava o botão da câmera, e nem dos diálogos estabelecidos naquele momento: era como se parte da sua alma tivesse sido roubada, de fato, naquele exato momento do clique, como nas antigas estórias indígenas.

    e o lavador de pratos chega em sua casa, ali entre os cortiços abandonados e as calçadas podres. esgotado. milhares de pensamentos se interpelando uns aos outros. mas um se sobressaía: "que diabos eu estava pensando quando eu disse "adeus"? e nesse momento ele tinha dois semblantes: um externo, inexpressivo, indiferente de tudo que o rodeia, e um interno, agonizante, aquela sensação de quem fez uma puta cagada, algo irreversível, imutável. incurável. preparou a comida do gato e uma refeição pra si, tragada e embolada sobre uma garrafa de cerveja. saiu na porta da cozinha e sentou no degrau, desconsolado, acendendo um cigarro.

    então ouviu um sibilo vindo das sombras detrás da caçamba de lixo, um grunhido alongado, feito um imenso e orgânico arroto seco. levantou intrigado, curioso feito seu gato em ambiente estrangeiro a si, e se aproximou da caçamba. da escuridão se escancara a mandibula préistorica de um crocodilo imenso de 3 ou 4 metros de fuça à rabo, o abocanha e engole inteiro o lavador de pratos, inerte a qualquer reação. se arrasta de volta para as sombras, mudo, mimetizando a escuridão, como se não tivesse saído de lá. como se nunca estivesse lá.

    sobre quizes do Facebook (ou Thomas Pynchon) (ou Tristan Reveur)

  • quinta-feira, 13 de agosto de 2009
  • Wash.
  • óbviamente você já deve ter feito um desses "quiz" do Facebook. pois bem, minha singela opinião, se é que ela vale de algo (e nesse momento vale!) : a maioria são imbecis, são uma grandississima perca de tempo, alguns são bem barangos mesmo... mas a merda é VICIANTE!!! alguns pouco são geniais, principalmente pra gente aficcionada em Top Lists, como eu sempre fui, desde pequeno. assim que aprendi a escrever, uma das primeiras coisas que fiz foi começar a relacionar todos os Top Lists que eu tinha em mente, uma coisa assim bem de "criança com TOC", coisas inúteis como as maravilhas da antiguidade, tudores da Inglaterra, programas de tv, musicas de rádio, comediantes, atores, músicos, bebidas, mesinhas de ferro de buteco... qualquer merda. mas enfim, voltando ao Facebook, eu acabei que preenchi, entre outros quizes, um que dizia "Qual Escritor Maluco Você É?"; o resultado foi Thomas Pynchon. curioso ter dado esse resultado porque uns dias antes eu estava fuçando informações justamente sobre esse cara: um pirado recluso, desde 1950 ninguém sabe exatamente como é sua cara, a não ser seu editor. odeia repórteres, entrevistas... qualquer coisa que coloque um dedinho em sua privacidade (no pum intended) o cara surta e desaparece! da mesma laia de gente como JD Sallinger ou o nosso "vampiro de curitiba" Dalton Trevisan. mais um detalhe pra adicionar a personalidade perturbada do fita: só escreve sobre conspirações e relações auspiciosas sem um fio aparente que as ligue. contracultura, pop art, drogas e rock'n roll também fazem parte do cardápio do sr. Pynchon "freak blood sucker" ou o que quer que ele seja. isso tudo foi motivo de sobra pra que eu procurasse com afinco um livro dele. minha intensão era encontrar "O Arco Iris da Gravidade", mas "V" foi o que eu encontrei primeiro. comprei, comecei a ler. até o exato momento não tô entendendo PORRA NINHUMA... mas vamos esperar até o final e eu falo o que acontece. (se eu entender, claro).

    Nesses mesmos dias de paralelos coincidentes (tem a ver, pode crer!) aconteceu-me de rever um filme que há uns meses atrás me passou completamente desapercebido, simplesmente não me chamou a atenção, sei lá porque. o filme era "Stay", que pra variar recebeu o nome suecado de "A Passagem". nem comento. enfim, tem no cast Ryan Gossling, Ewan McGregor e aquela loirinha, err... Naomi Campbell, essa ae!

    vá lá, dessa vez eu tava mais relax e dei mais atenção pra trama. de primeira mão, parece só mais um draminha bobo: um psicólogo tentando ajudar seu paciente, um candidato à suicida que tem até data marcada para o evento, e blablabla e coisa e tal, e vai o doutor tentar convencê-lo à não levar a promessa à cabo, e blablabla e coisa e tal. mas com devida atenção, a estória se revela muito mais que isso. revela um garoto reservado, intrigante e auto-destrutivo, que consegue manipular dèja-vus!! (sei lá como ele faz isso). o desenvolvimento disso meio que transforma a realidade do psicólogo num vai-e-vêm de dèja-vus, num misto de confusão de identidade e sonho de noite mal-dormida. se falar mais, estraga.

    a parte que me interessa segue meio por fora disso; em certa parte do filme, o psicólogo descobre que o garoto frequenta uma livraria onde, de acordo com o livreiro, ele teria trocado algumas pinturas de sua autoria por um punhado de livros, todos do mesmo autor: Tristan Reveur. Você já ouviu falar em Tristan Reveur? então. no decorrer do filme não se toca muito mais no nome desse cara, daí eu fiquei em casa pensando "tristan reveur, tristan reveur... quem foi esse cara que eu nunca ouvi falar, diabos??"

    internet serve pra essas coisas de curiosos-nerds-atormentados que não se seguram à uma nova informação, têm que saber, PRECISA saber do que se trata. é uma compulsão, eu concordo, mas isso já livrou minha cara em provas sobre assuntos da atualidade e desenvolvimento de conversas de mesa de bar com gente que eu acabara de conhecer, entende?... no fim, tem a sua utilidade. então era um fato novo que eu não sabia nada sobre o cara. corre pra internet e já bota lá no campo de busca do Google, Tristan Reveur.

    eis que pra minha surpresa, as informações que se tem sobre esse cara... não existem! tristan reveur foi um escritor influente e famosíssimo... inventado pro filme. e eu adoro essas coisas! é legal ser categóricamente enganado! no bom sentido, é claro. sim, existe um bom sentido em ser enganado: ser passado de trouxa, corneado, roubado, isso não é legal. mas algo que, de certa forma, te faz acreditar numa coisa que não existe? isso é fato de ser aplaudido de pé, eu penso. o lance da Bruxa de Blair, poxa, eu sei que aquilo é malhado, ficou demodé... mas quando o filme saiu, botaram maior pilha de que os acontecimentos realmente haviam acontecido, inclusive firmando credibilidade com o fato dos atores do filme simplesmente SUMIREM dos avant-premiéres e entrevistas de lançamento. na época eu achei genial; técnica de marketing inovadora. agora eu acho interessante.

    hmm, é isso. Thomas Pynchon pra Stay pra Tristan Reveur pra Bruxa de Blair pra nada mais. se isso fosse um exercício de aula de redação, o tema seria: "transite de um tema para outro de forma desordenada, afm de deixar o leitor sem entender o que vc quer dizer..."

    sobre assuntos que não conseguiremos entender nunca.

  • sexta-feira, 7 de agosto de 2009
  • Wash.
  • hoje, não por acaso, tive o insight de pensar que a vida é como um relógio. não um relógio qualquer. um bem específico; um relógio de pulso que em 1945 foi encontrado em Hiroshima e que marcava, congelado, a hora 15h39: hora exata que a bomba caiu no epicentro da explosão. momento fotográfico, 70 mil vidas ceifadas instantaneamente. claro, isso é muito mais significante do que se imagina, mais significante do que até onde vão nossos motivos obsoletos. mas pensa bem: um relógio, apenas um relógio, representando toda a razão por trás disso, cada vida e cada motivo de viver, tudo representado num momento fixo do tempo. e lá se foram todos os detalhes de 70 mil vidas pela razão equivalente de apenas um punhado de interesses politicos: a complexidade da estória toda mora aí.

    complexidade, ahhh! a complexidade! já tem um tempo que eu venho notando um fato pitoresco na minha vida - ou na vida dos outros, você decide: (quase) todas as pessoas que me cercam, de certa forma, sibilam entre a genialidade e algum disturbio emocional ou mental. a escolha é minha, óbvio, mas as caracteristicas são marcantes: manias, paranóia, TOC, depressão, sindrome do pânico: parece que é uma REGRA contra a vida comum, contra a vida ordinária: se quer ir contra a maré, ok!... mas não vai sair ileso!! essa é a condição. essa é a lei gravitacional. é o preço que se paga por ser diferente. é a controversia da vida social instituida. é o reverso do conformismo estipulado.

    eu me firmei, com auto-votação unanime, entenda, como integrante de uma geração inteira que PRECISA de um disturbio pra poder viver na sociedade EM PAZ consigo mesmo. é inevitável e faz parte de todo um ciclo de evolução involuntária, o mesmo ciclo iniciado há seculos atrás, por Galeno, procurando uma "alma orgânica" no que ele inconscientemente chamou de Retemirabile; uma idéia que mais tarde foi depurada por Descartes, depois exaltada por Nietsche, depois decomposta por Dostoyevski, depois desmistificada por Sartre... e depois massificada, estereotipada e banalizada por... nós!, a massa moderna que PENSA que sabe tudo.

    eu faço parte disso. veja bem: hoje pensei muito sobre cada motivo que me leva a tomar cada decisão do dia-a-dia. pensei sobre cada decisão tomada e sobre cada consequência exercida por essas pequenas decisões. pensei muito, mas muito mesmo, sobre a idéia formada que tenho sobre o mundo em que vivo, de como ele foi um dia, e sobre como ele poderá vir a ser, num futuro incerto. pensei também sobre o que o cara que voava no Enola Gay sentiu quando soltou a bomba sobre Hiroshima. e pra variar, eu sempre penso em filmes: pensei num filme que eu vi, um tempo atrás, na tv mesmo, chamado In the Edge, que conta a estória de um cara que rouba um carro e se joga de um precipicio com ele, basicamente pra "ver qual é", e mais tarde, sendo forçado a integrar um "grupo terapeutico de suicidas", percebe o que rola de verdade - DE VERDADE - nesse mundo: em SEU mundo, no mundo que ele inevitavelmente foi inserido. o resultado é triste, mas é, como a proposta mesmo diz, inevitável. porém ainda é esperançosamente reversível.

    me peguei, enfim, pensando que todos estamos sujeitos à essa intempérie da evolução. eu, que perco meu tempo falando sobre o que não sei direito. você, que ocasionalmente perdeu seu tempo lendo isso. ele, que teve o impulso de cometer o que teve vontade.
    e no fim, não tive coragem de recriminar ninguém. afinal, quem foi Galeno? quem foi Descartes? quem foi Nietsche, Froyd, Hesse, Sartre?... ora! quem sou EU, pra julgar os motivos de cada um?...


    (in memorian ao bom amigo Marco "jegão")

    e mais uma temporada de bloqueio...

  • sábado, 1 de agosto de 2009
  • Wash.
  • "só trabalho sem diversão faz de Jack um bobalhão."
    "só trabalho sem diversão faz de Jack um bobalhão."
    "só trabalho sem diversão faz de Jack um bobalhão."
    "só trabalho sem diversão faz de Jack um bobalhão."
    "só trabalho sem diversão faz de Jack um bobalhão."
    "só trabalho sem diversão faz de Jack um bobalhão."
    "só trabalho sem diversão faz de Jack um bobalhão."
    "só trabalho sem diversão faz de Jack um bobalhão."



    seria uma boa ir pra um hotel, em pleno vigor do inverno e no meio do nada, pra aparecer um pouco de inspiração??... acho que não precisa tanto, né: bastaria ir até um Starbucks com meu laptop debaixo do braço, sentar numa mesa isolada e pedir um expresso grande, pra poder ficar toda hora misturando com leite de graça e com o açucar aromatizado de baunilha. é, funcionaria de certo. se a bateria do meu laptop ainda funcionasse, com certeza eu faria isso. saco de bateria viciada...